Kleber
Tomaz e Isabela LeiteDo G1 São
Paulo
Um vídeo
de 30 segundos que circula por meio do aplicativo WhatsApp mostra o homem que
invadiu o Fórum Butantã, na Zona Oeste de São Paulo, ameaçando atear fogo na
juíza que ele manteve refém na tarde de quarta-feira (30). O Bom Dia São Paulo
exibiu trecho dessa gravação nesta quinta-feira (31) (veja o vídeo acima).
Outras
imagens também circulam por meio de celulares mostrando o momento da prisão do
agressor.
A filmagem da ameaça foi feita por celular por um policial militar, atendendo
uma das exigências de Alfredo José dos Santos, que segurava a juíza Tatiane
Moreira Lima, da Vara de Violência Doméstica, pelo pescoço. Ela foi mantida
refém por cerca de 20 minutos.
O agressor, que teria cursado ensino técnico em química, havia jogado líquido
inflamável nele e em Tatiane e ameaçava acender um isqueiro. Ele foi preso pela
Polícia Militar (PM) quando se distraiu com a gravação.
Por conta
do incidente, o Fórum ficará fechado nesta quinta-feira (31). Todas as
audiências agendadas foram canceladas e serão remarcadas. De acordo com
Tribunal de Justiça (TJ), "se constatadas falhas, medidas corretivas serão
tomadas de imediato".
O G1
não conseguiu confirmar se Alfredo constituiu advogado para defendê-lo. A
equipe de reportagem também não localizou Tatiane para comentar o assunto.
saiba
mais
Alfredo responde
na Justiça por agressão à sua mulher, em 2013. Ele estaria sujeito à Lei
Maria da Penha, que protege mulheres vítimas de violência ou ameaças.
O homem, que dizia nas imagens ser inocente, tinha uma audiência marcada com a
juíza às 14h. Segundo policiais ouvidos pela equipe de reportagem, o invasor
estaria insatisfeito com a magistrada, que teria tirado dele a guarda do filho.
Os agentes contaram que o agressor estava visivelmente abalado
psicologicamente.
“Tá filmando isso aí?”, indagou Alfredo para os policiais, enquanto mantinha a
magistrada refém. “Coloca na televisão”.
As cenas
não mostram, no entanto, a prisão do homem, que carregava uma mochila com
artefatos suspeitos e garrafas com líquido inflamável, como gasolina e
querosene. De acordo com policiais, dentro também estaria um dinossauro e uma
arma de brinquedos, além de um capacete militar com a inscrição 'inocente'.
Segundo a Secretaria da Segurança Pública (SSP), Alfredo foi levado ao Hospital
Universitário e liberado do atendimento médico.
Em
seguida, passou por uma delegacia, onde poderia ser indiciado por tentativa de
homicídio e outros crimes. O boletim de ocorrência foi registrado no 51º
Distrito Policial (DP), no Butantã, onde o delegado Milton Toschi confirmou a
prisão em flagrante do homem por ter jogado líquido inflamável na juíza.
Após a elaboração do Boletim de Ocorrência, ele seria transferido ao 91º DP,
Ceasa. A juíza foi levada ao Hospital Albert Einstein e liberada. Policiais
disseram que o agressor dizia que 'juiz não é Deus'.
O caso
O crime aconteceu por volta das 13h30. Segundo policiais, Alfredo invadiu o
Fórum do Butantã correndo pela saída, sem passar pela segurança. O local não
teria detector de metais. Ele subiu as escadas ateando fogo no piso.
Um
segurança chegou a atirar na direção do invasor, mas o disparo teria atingido a
parede. Sem ser barrado, Alfredo correu até o gabinete da juíza, a agarrou pelo
pescoço e despejou um produto químico nela.
Quando
seguranças do fórum chegaram à sala, Alfredo segurava a juíza pelo pescoço.
Após negociação com a polícia, ele exigiu que as pessoas na sala filmassem ele
segurando a magistrada. Pedia para que ela dissesse que ele não era louco e era
inocente. Também pediu que chamassem a TV. A gravação foi feita por um
policial.
Veja
abaixo o diálogo gravado por celular:
Alfredo
José dos Santos - “Tá filmando isso aí?”
PM1 – “Tá.”
Alfredo – “Coloca na televisão.”
PM 1 - “Calma, calma, calma. Tenha calma, pô! Eu quero te ajudar, pô!”
Alfredo - “Quero a televisão aqui, agora.”
PM 1 - “Já pedimo (sic), tá vindo.”
PM 2 – “Tá vindo.”
PM 1 - “Tô sem arma, pô. Fica calmo.”
Alfredo - “Só um minutinho. Peraí, peraí. Eu sou louco?”
PM 1 - “Ninguém quer te prejudicar ”
Alfredo - “Fala para eles bem alto. Eu sou louco?
PM1 – “Ela é inocente.”
Juíza Tatiane Moreira Lima – “Você não é louco.”
Alfredo – “Pera só um pouquinho... Três vezes.”
Juíza – “Você não é louco.”
Alfredo - “Mais uma!”
Juíza – “Você não é louco.”
Alfredo - “Sou culpado de algum crime?”
Juíza – “Não. Nenhum crime.”
PM 1 – “Tenha calma.”
Alfredo – “Vocês ouviram?”
Juíza – “Nenhum crime.”
Alfredo – “Vocês ouviram?”
PM 1 – “Tá filmando.”
Alfredo – “Tá filmando isso aí?”
PM – “Tá.”
Alfredo – “Coloca na televisão.”
Ao
término da gravação acima, ele foi detido pelos policiais, rendido e preso. A
juíza acabou libertada. Essa ação da prisão também foi filmada. Um vídeo de 1
minuto e 50 segundos mostra policiais aproveitando um momento de distração do
agressor e avançam sobre ele, o imobilizando. Em seguida, um extintor é jogado
para impedir que ele ateasse fogo na vítima.
"Eu sou inocente, eu sou inocente", dizia Alfredo aos policiais que o
algemavam.
"Ele [o agressor] falou que tá cheio de coisa aí dentro", disse em
seguida um policial, se referindo a possíveis produtos inflamáveis colocados no
fórum.
Gate
Segundo técnicos da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) e
bombeiros, o produto jogado pelo homem na magistrada seria químico. No entanto,
eles não souberam afirmar qual seria especificamente o material.
Por conta do incidente, o fórum passou a tarde de quarta-feira fechado e
cercado pela polícia. O Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate), da PM, foi
acionado para fazer uma varredura no local e verificar a possibilidade de
explosivos. Caminhões do Corpo de Bombeiros e equipes da PM também foram
deslocados.
A área foi liberada por volta das 19h20 de quarta-feira, quando o Gate deixou o
fórum levando um artefato suspeito de ser uma bomba caseira.
Magistrados
Por meio de nota, a Associação Paulista de Magistrados (Apamagis) manifestou
"integral apoio e solidariedade à nossa colega juíza da Vara de Violência
Doméstica, do Foro Regional do Butantã, alvo, nesta data, de grave e inusitado
atentado, praticado provavelmente por pessoa que estava sob a sua jurisdição,
que invadiu o prédio público munido de líquido inflamável fazendo a magistrada
de refém".
Os
membros da Associação informaram ainda que "repudiam qualquer ato de
violência e reiteramos a necessidade de que os membros da Magistratura tenham
proteção contra atos que atentem contra sua integridade física, coloquem em
risco suas vidas e afetem diretamente o Poder Judiciário. Essa proteção só se
efetivará quando da criação de uma política nacional de segurança eficaz aos
magistrados".
De acordo
com a nota da Apamagis, um "Poder Judiciário forte e independente é o
pilar de sustentação do Estado Democrático de Direito e seus integrantes devem
ter total proteção do Estado para o desempenho do exercício de suas
funções".
A
Associação finalizou o comunicado informando que "confia nas autoridades
na célere e eficaz apuração destes fatos ocorridos no Foro Regional do Butantã
e desde já agradece as manifestações de solidariedade de outras instituições
ligadas à Justiça".